quinta-feira, 26 de maio de 2011

Outro outro

Aviso que este texto foi totalmente baseado em minha memória. Portanto, se eu cometer o pecado da omissão, não é para atentar contra qualquer inocente, a não ser contra mim mesmo, mesmo que não seja eu tão inocente; e como não há aqui a intenção de causar prejuízo de qualquer ordem ou desordem, pois o principal envolvido sou precisamente eu, digo que este talvez falso testemunho não possa me levar ao index ou algo do gênero.
Não creio que a memória possa ser-me fiel, mas acho que também ela seja capaz de mover uma montanha ou outra. Se não tanto, ao menos pode alterar, para mais vivas ou mais desbotadas, algumas cores do mundo, mesmo que de um mundo particular, originado de minha própria lembrança e, portanto, de minha própria memória e, justamente por esses fatos, é que não lhe tenho tanta devoção, pelo menos na medida certa para não alterar este singular relato. 
Havia saído do serviço para o intervalo de almoço, numa manhã de inverno absurdamente fria, mas ensolarada. Cansado, como sempre, desanimado, os olhos pesados... não só pela manhã que já configurava um objeto do passado — portanto da memória, mesmo que ainda muito vívida — mas também pelo assombro da tarde vindoura, quando resolvi sentar em um banco da praça, para tomar algum fôlego, justamente em frente a um antigo teatro (hoje pecaminosamente interditado), numa época que ainda havia um espetáculo e outro por lá, quando percebi, mas apenas por um relance do olhar, que um sujeito velho, de pálpebras marcantes e olhar fugidio, posto a assobiar sentou-se ao meu lado, na outra ponta do banco.
Pensei tratar-se de outro, feito eu. Mas era apenas alguém que passava e, por puro despautério, sentou-se no mesmo banco, mais para apreciar a paisagem do que propriamente para tentar fazer com que eu me movesse dali. Pensei, também, que, se Jorge Luis Borges poderia ser capaz de encontrar a si mesmo sentado em um banco, poderia eu da mesma forma encontrá-lo. Mas não: simplesmente saí novamente a caminhar em direção à tarde que se aproximava, quando ao dobrar a esquina vi chegar, vagarosamente, outro, idêntico àquele que se sentara no banco momentos antes, para então tomar a outra ponta do banco.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Velha poética

Após tentar enfrentar o cânone, proferindo um tipo de escrita formalmente subversiva, ou pelo menos semanticamente intrigante, ou mesmo ensaiar um pequeno e quase inaudível rosnado contra o tal, ainda que de forma bastante tímida, e romper com os padrões formais da literatura, sendo atacado por todos os lados e em todos os sentidos por loucos, invejosos, puxa-sacos, deslumbrados, ociosos, ignorantes, pseudo intelectuais e pelos mais diversos tipos de ser humano, leitor alfabetizado ou analfabeto, sendo mal interpretado e mal interpelado, chego à conclusão de que, após breve reflexão a respeito da teoria do poeta sórdido, do Manoel Bandeira, a nova poética é inatingível, pelos leitores, mas principalmente pelos poetas, que se voltam cada vez mais não só para uma ligação com os padrões e modelos pré-determinados, mas para uma composição infantil, o que significativamente quer dizer que a nova onda poética que nos atinge é tão falsa quanto a atual juventude comunista que ocupa-se mais de vestir camisetas do Jack Daniel's do que comunizar propriamente, e verdadeiramente, a nova poesia constitui-se de palavras difíceis, conceitos vagos, sentimentalismo, pieguice, não passando de um arranjo de palavras bonitas, mas ao mesmo tempo vazias proferidas não menos que por alguém sentado em uma cadeira na frente de um computador a lamentar ou a exaltar um amor passado e ido, fictício ou real, mas seja lá como for, afogando na retomada vã do romantismo, do tipo: oh, meu irmão, quem como eu a não te ver está cansado das sombras diáfanas que aos olhos metafóricos fogem da esfinge no sofá e blá-blá-blá.
Eis que surge um novo poeta forrado de velho. Todavia ainda existem aqueles que acreditam que o concretismo trará ou trouxe, mesmo no passado ainda não descoberto, uma explicação para tudo isto, ou ao menos mais uma teoria, mais como manifesto do que como movimento em si, mas sabendo que tudo isto seria possível ou tentado, também eles teriam desistido.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Parei de fumar cigarros

É verdade. Mandei aos diabos aquela imagem mental do intelectual que solitariamente fuma enquanto tece um novo texto, ou toma café e acende um cigarro para, com bastante charme, reiterar seu pessimismo inato. Claro, tudo coisa de intelectual. E afinal de contas essas imagens fazem muito sentido, desde que a pessoa esteja em Paris nos anos de mil oitocentos e quarenta, ou em outro lugar qualquer onde se possa indiscriminadamente dar umas baforadas.
Nunca pretendi usar este espaço para exercitar a pieguice, mas parar de fumar é algo que requer bastante ajuda, de si mesmo e algumas outras, vindas do exterior, digamos. O pior é que, quando se larga a merda do cigarro, tudo em que se pode pensar é que aqueles relatos dos que diziam que era uma experiência bastante intensa e dolorosa estavam absolutamente certos. 
O sujeito para de fumar tabaco e passa a ter prisão de ventre, insônia, dificuldade de concentração, irritação, o humor piora bastante, dentre tantas outras manifestações sintomáticas e assintomáticas também, além de que os benefícios por parar parecem vir somente depois de muito tempo, ou ao menos são percebidos somente depois de um tempo considerável.
Seja como for, é preciso encontrar um motivo para manter a coragem e a determinação, caso contrário, logo o sujeito não só passa de ex-fumante para fumante passivo, porque passa a procurar rodas de fumantes para disfarçadamente poder inalar um pouco de fumaça, como também corre o risco de voltar a fumar desesperadamente um cigarro após o outro, acendendo aquele que recém foi sacado do maço naquele que acabou de fumar, já sem esperança de parar em qualquer tempo, já sem sequer pensar na imagem do intelectual, já sem degustar pelo menos um café forte ou fraco, já sem ligar para o resto todo, pensando apenas no prazer imediato garantido pelo minúsculo tubo de fumaça.
Um dos argumentos encorajadores para o candidato a ex-fumante é o de que, logo depois de completar um mês, pode-se procurar outros amigos, que também pararam, para juntos contarem a todos na roda de conversa sobre o esforço heróico, sobre como foi difícil, sobre como não se deixavam abater a cada vez batia aquela miserável  vontade de acender um daqueles malditos.
Também constitui um excelente argumento o fato de que o governo arrecada milhões em impostos sobre os cigarros, dinheiro este que pode muito bem ser canalizado pelos canais de corrupção e financiar sabe-se lá qual barbárie. Claro, se o sujeito que tenta parar é daqueles que não acredita em corrupção, podemos usar este dado de outra maneira, visto que poderá passar a ser visto como subversivo por se negar a repassar dinheiro de impostos ao governo, o que, temos de convir que possui muito mais charme do que soltar fumaça por determinados orifícios do corpo.
Outros argumentos podem ser encontrados nas revistas ou livros de auto-ajuda, claro. Mas não pretendo expor nenhum deles aqui.
Mas existem, também, alguns mitos sobre parar de fumar. Vejamos alguns:
Parar de fumar engorda: Mito. Prova de que tal idéia está errada é que nunca elefante algum fumou em toda sua vida e, conseqüentemente, nunca parou de fumar. Entretanto os elefantes são gordos.
Baudelaire dizia maravilhas a respeito de fumar e enxergar os demônios que assolavam a alma na fumaça do cigarro: Verdade. Mas tenta encontrar o Baudelaire para te dizer isso hoje. Por onde ele andará?  Obviamente não pode ser encontrado (não aceitarei respostas que digam: Montparnasse). Portanto não sei se este pode ser considerado um apontamento válido e apenas citei-o aqui para endossar a minha imagem de intelectual incompreendido, embora atualmente o Baudelaire se me afigure um clichê. E também, essa história de enxergar coisas na fumaça pode não soar muito bem, principalmente depois de umas doses de conhaque, já que do absinto me abstenho.
Mas a verdade é que eu poderia ocupar um enorme espaço virtual do blog fazendo apontamentos e digressões a respeito de parar de fumar cigarros, mas acho que ficaria um tanto cansativo para o leitor habituado com textos rápidos daqui. No entanto, ocupo-me em escrever para não cair na tentação.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Faça você mesmo II

Agora as coisas de modo mais complicado, de forma que servem apenas aos leitores mais avançados e experimentados: 

A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V, W, X, Y, Z
a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, k, l, m, n, o, p, q, r, s, t, u, v, w, x, y, z.


Embora eu acredite que, mais especificamente no Brasil, possa ser ignorada a existência do "k", do "w" e do "y" e, vez por outra, omitido um "h".


Mas a verdade por trás de tudo isso, de todo esse enigma, é que com apenas algumas infinitas possibilidades de variação e combinação do que está acima exposto posso escrever qualquer livro do mundo, inédito ou não, bem como qualquer pessoa pode apropriar-se destes signos e muito bem produzir infinitas obras.
Desistam, escritores, tudo já foi feito. 

terça-feira, 3 de maio de 2011

Faça você mesmo I

Primeiro as coisas de modo claro e simplificado, mas ao mesmo tempo norteadas por um (in)determinado senso instrutivo do autor, o que, convenhamos, priva parcialmente o leitor do prazer da livre interpretação:
  
Caixa; à; dizer; passa; modelo; texto; portuguesa; martelo; preposições; língua; xícara; palavras; resto; ordem; português; todas; fazer; azulado; gasto; encadeamento; andando; posteriores; saído; ambição; mito; com; água; palavras; papelama; uma; decote; animalização; vendido; carnavalização; livro; laranja; sem; cantos; atirando; ponte; texto; ensolarado; fósforo; qualquer; pronomes; canhão; cachaça; sob; parapeito; ilustração; sexo; janela; aleatoriamente; escolha; saudado; número; sal; substitui-lo; catacrese; verbos; que; catarse; conta; abelha; esquerda; mesmo; cachorro; zênite; existem; obedeça; absorvido; parcial; hereditário; atávico; jacaré; sobre; latinidade; hiato; de; escolhi; mundo; romaria; extraditado; país; diversos; aderente; vãs; best; possíveis; da; que; a; que; a; de; e; no; um; ou; texto; ou; eu; ou; de; muito; não; o; no; de; de; que; a; não; o; o; do; com; livro; ou; o; mais; no; ou; é; a; sua; um; não; de; que; estas; para; que; e; de; sim; que; é; e; palavras; de; do; conceitos; si; de; por; de; no; livro; mas; o; no; as; com; e; texto; as; eu; as; ou; de; a; o; ser; o; ideologia; em; percepção; aleatoriamente; que; da; antecipação; reformulada; contra; harpa; grego; barganhando; gaita-de-fole; vindo; a; esquema; variedade; professor; egresso; canto; impedimentos; fiança; advérbios; senis; actum; perfeitamente; para; número; pós; quinquilharias; ante; coração; desde; parlamento; diminuída; nosso; vós; entre; quarenta; palavras; este; qualquer; maiúsculas; ligação; guardarei; também; e; far-se-á; chamado; que; da; ordem; algumas; considerado; texto; umas; talvez; assim; com; parafrasear; alfabeticamente; próxima; assim; pode; determinado; inteligível; representado; escritor; minúsculas; encadeamento; macaco; comprovações; colocação; grafemas; portuguesa; sentido; introdutório; palavras; da; enigma; em; subjetiva; defendido; aleatórios; sinonímia; mais; exprimindo; eternidade; psicológico; de; mas; talvez; teorizações; apenas; pode; que; como; para; mercê; fonemas; para; escreveria; envolverá; para; seja; sendo; quer; diz; ser; datilografando; pista; aleatórias; apenas; aquela; que; vários; leitor; decifrar; como; alemão; uma; sua; texto; livre; letras; os; que; o; não; ou; leitor; piada; nenhum; dispuser; pois; tenho; palavras; uma; ordenadas; toda; que; pela; livros; brasileira; deixarei; alguma; dois; utilizadas; para; italiano; um; mas; é; gostaria; confundir; autor; produzir; se; apenas; bem; portanto; seja; texto; que; provar; premiado; sobre; faz; este; mesmo; adjetivos; da; leitor; teoria; bom; palavras; muitos; indiscriminado; passam; seja; palavras; utilize; francês; das; mundo; escrevi; seller; soltas; erotismo; sintaxe; difere; melhor; qualquer; categorias; do; dizer; mundo; em; alguém; soltas; fazer; como; obra; uma; conceito; sem; mas; qualquer; latim; isto; relação; pessoa; encadeadas; como; desse; criança; vez; fundo; uso; existentes; tipo; portanto; as; mesmo; para; já; pelo; tanto; seu; velho; foi; sejam; que; ou; sem; o; entre; bem.




Maiores informações em um momento mais oportuno. Mas tanto tempo de trabalho para nada?