terça-feira, 14 de setembro de 2010

Extinção

Talvez um dia o tatu-bola, o ser humano, o cão doméstico e o gato acabem desaparecendo totalmente, deixando para trás apenas algumas ilustrações em livros de ciência. Quem sentirá falta deles? Talvez ninguém, talvez todos os restantes, aquela forma de vida evoluída que passou a ocupar o lugar que a nós, homo sapiens sapiens, era destinado neste planeta.
O certo é que uma espécie já foi extinta e não ninguém disse nada a respeito. Aquela espécie que ocupava lugar em estantes, mesas de centro das salas de estar. Todas tias velhas ou avós tinham o seu. Ele ficava azul, violáceo ou rosado, dependendo das condições do tempo.
Sim, o galo do tempo foi extinto. Extinto e nenhum caçador pode ser acusado de seu desaparecimento. Substituído por sites da internet, radares e telejornais. Hoje, basta o sujeito procurar um site qualquer de previsão para saber, por exemplo, como vai estar o tempo nos próximos dez dias, a velocidade do vento e a quantidade de chuva, mesmo que seja em Moscou. E sabe-se lá porquê alguém no ocidente precisa saber como anda o tempo em Moscou.
Foi-se o galo do tempo. Claro, ele tinha suas desvantagens. Não dizia qual seria a temperatura do dia, a máxima, a mínima, e nem sempre acertava em suas previsões. Às vezes era simplesmente a umidade relativa do ar que estava mais alta e ele dizia que ia chover, mas obviamente o galo nunca se importou com umidade relativa ou absoluta.
Talvez tenha sido dispensado por alguns atribuírem suas mudanças de cor a uma certa indecisão política, afinal ele não ficava vermelho, ou o vermelho era desbotado demais. Não ficava verde, portanto, não se podia dizer que fosse um nacionalista.
Mas por que foi extinto? Seu caso não era igual ao do pinguim de geladeira, que foi acusado de cafonice, mas que parece estar voltando com força nas revistas de decoração. Nada disso. O galo era pequeno demais para ser notado e também para esse tipo de interferência visual e estética.
Mas sentimos falta do galo do tempo, que levou consigo um pouco da sabedoria popular, um pouco do modo simples de ver a vida, a recordação dos tempos em que não precisávamos de uma infinidade de aparatos tecnológicos para saber se poderíamos ou não sair de casa, dos tempos felizes em que telefone funcionava com fichas e para discar tínhamos que girar aquela roda enorme e pesada, aquele tempo em que a terminação "pédia" era para enciclopédia mesmo, qunado pesquisa se fazia com o nariz enfiado em um livro, tempo em que recortar e colar era para se fazer com revistas velhas, nos trabalhos para o colégio.
Foi-se o galo do tempo e esperamos que não o acompanhe a previsão baseada nas dores dos calos dos mais velhos.