domingo, 9 de março de 2014

Previsão de memória

Não faço previsões. Acredito que a memória fica cada vez mais comprida, não sei se menos confiável, mas acaba ocupando mais espaço, feito um arquivo de gavetas muito compridas, no qual temos que esticar um bocado o braço para alcançar a última ficha. Sei que neste ano muitos farão homenagens ao Senna e ao cara do Nirvana, mas gosto mesmo de lembrar que há vinte anos, a Noeli, quando dava aulas de violão ao grupo que chamava de orfeonistas, e do qual eu orgulhosamente fazia parte, já que foi o que considero ter sido a minha primeira banda, em um final de tarde absurdamente frio, entre o fim do turno da tarde e o início do turno da noite, conseguiu reunir os que faziam parte daquele grupo, para ler poemas do Quintana, em uma homenagem dela e nossa ao poeta que acabava de partir. Também há vinte anos meu pai chegou em casa com um livro de poesias do Paulo Mendes Campos, Domingo Azul do Mar. Não era a primeira vez que eu lia Paulo Mendes Campos, mas era a primeira vez que eu lia os poemas do Paulo Mendes Campos, e mais ainda: a primeira vez que lia poesia com atenção. Creio que gastei o livro de tanto ler, e memorizei boa parte dele. Talvez por isso mesmo tenha alocado esses poemas em uma parte bem da frente do meu arquivo. Mas a verdade é que foram essas duas coisas que acabaram, naquele ano cheio de acontecimentos, fazendo a verdadeira revolução na minha cabeça.