quarta-feira, 13 de julho de 2011

Dia mundial, internacional, continental, nacional, estadual e municipal do Rock

Paradoxalmente o que faz de nós o que somos no presente é o que fomos no passado, mesmo que não muito distante. Portanto, o que experimentamos hoje nada mais é do que uma projeção de algo que ocorreu antes entrecortado por um bocado de sensações, julgamentos morais e subjetividade e talvez por isso mesmo o cérebro fique preguiçoso se não aprender nada novo. O cérebro atrofia-se caso não precise se preparar para projetar coisas e fazer comparações futuras, ou no caso, presentes.
Mas a verdade é que pessoa alguma de minha geração ou da geração futura pode compreender o que foram os beatles, já que receberam a informação através dos pais, como no meu caso, que tenho pais que amam os beatles e gostam dos Rolling Stones com algumas restrições, então o julgamento subjetivo foi-me passado e absorvi a antipatia ou a simpatia, dependendo da antítese cabível em determinado contexto.
Levando tal consideração em conta eu nunca poderia fazer algum julgamento preciso a respeito dos beatles  ou dos Rolling Stones, já que minhas impressões estariam contaminadas pelas de meus pais e de toda uma geração anterior com um bombardeio de informações mais ameno do que os bombardeios de informações de hoje, mas bombardeios mesmo assim, com direito a confusão e vertigem mental.
O Quino, criador da Mafalda, disse em uma entrevista que os beatles estragaram-no musicalmente. A própria Mafalda de suas tirinhas é fã dos beatles, assim como outros da sua turma. Mas da declaração do Quino, o que mais me chama a atenção é o uso da palavra "estragar". Talvez o maior prejuízo que os beatles tenham causado para a geração de meus pais, além de tornar as calças jeans mais caras, segundo o próprio George Harrison, foi o de estraga-los musicalmente, de fazer pensar, embora não estivesse muito longe da verdade, que as outras bandas não eram boas. Este era o perigo da meia verdade e das comparações, pois há frequentemente a ideia tosca de que se temos duas coisas e dizemos que a primeira é melhor do que a outra, fatalmente a segunda passa a ser ruim. Corremos, então, o perigo da privação e da não experimentação.
Mas como foi instituída uma data para comemorar o dia do rock, acho bastante justo e cordial escrever algo sobre rock e estas ilações anteriormente erguidas servem não apenas para justificar o fato de eu não falar hoje a respeito dos beatles, como para provar que posso não falar a respeito dos beatles justamente falando nos beatles.
Mas como hoje não quero perder tempo com ilações profundas ou com infindáveis digressões filosóficas venho apenas contar uma história que tem a ver com o rock e de como este maldito ritmo conseguiu corromper minha mente de uma vez por todas.
Acho que tinha na época uns 14 ou 15 anos e surgira, lá em casa, um disco do Jethro Tull. O aqualung, com aquela capa intrigante, uma pintura, diferente das outras capas. Claro, eu já sabia o que era rock, como a coisa funcionava, que tinha guitarras distorcidas e gente gritando no microfone. Sabia, inclusive, do protocolo do rock: introdução, refrão, solo de guitarra, eventualmente solo de bateria, que não podia ser muito longo, exceto nos discos ao vivo, e conclusão. Basicamente era isto.
Mas da vez primeira que ouvi Jethro Tull tudo pareceu perdido. Quer dizer, as guitarras estavam lá, mas tinha também violões e piano, o vocalista não gritava tanto, certas músicas não tinham guitarras, apenas violões, e algumas outras misturavam piano com guitarra. Quando eu achava que viria um solo de guitarra após um belíssimo riff e todo o cliché de composição no rock, vinha um solo de flauta, o que me assustou e ao mesmo tempo encantou. Uma daquelas experiências que são chocantes, mas que sabemos que são invitáveis e que jamais seremos os mesmos ao passar por ela. 
Foi assim que o Jethro Tull me despertou para o rock, ou me transformou no ouvinte de rock que sou hoje. Escutar o Jethro Tull aos 14 ou 15 anos foi algo que rompeu totalmente minhas expectativas com o rock, mas que, ao mesmo tempo, fez com que me tornasse um roqueiro de ouvido mais apurado, já que eles tinham acabado de derrubar enormes clichês, ou pelo menos assim me pareceu na época.
E isto é o que tenho a dizer sobre o dia mundial do rock, afora agradecer por não ter que, nesta data, gastar dinheiro com presentes ou ser repreendido por ter negligenciado algum parente ou seja lá quem que esperava receber um cartão.